06 maio 2012
PÃO-DURO NÃO!!!
Sabe quando alguém é tão pão-duro que irrita? Principalmente se esse alguém tem muitoooo dinheiro e se priva das pequenas coisas da vida por medo de perder o que tem. É o que ouvi minha irmã dizer sábado ao voltar de uma convenção: tem gente que escolhe "viver pobre e morrer rico". Adianta existir assim? Escrevi este conto faz tempo, mas diz bastante de algumas pessoas que conheço.
Eu não sei bem o que nos leva a escrever... Se é a inspiração ou a vontade de dizer o que quase sempre a gente não pode, não deve. A gente faz o que não quer, sente o que não gosta, finge o que não é, segura o que não tem de verdade — Eta vida louca! Mas não fui eu quem disse. Vieram antes de mim e deixaram registrada essa impressão.
E é assim que a gente existe. Alternando entre um sorriso e uma lágrima, um suspiro e uma reflexão. Terra de altos e baixos, manhãs de sol, dias de limites. Nem sempre a gente volta pra casa feliz; nem sempre a gente quer sair de casa; nem sempre a gente quer voltar pra casa.
Com Marculino deu-se o mesmo deslize de escolhas. Pobre desde menino, não viu outra razão de ser que não fosse a solidão — Casar pra quê?! Já era difícil se manter sozinho, quanto mais se fosse arranjar outras bocas para comer!
Começou como boia-fria, via o raiar do sol em meio à folhagem da cana e quando o céu conhecia os primeiros traços da noite, ele se despedia dos companheiros pulando a carroceria do velho caminhão, sussurrando um adeus reservado — um inté que ele quase segurava entre os dentes com medo de demonstrar qualquer emoção.
Os anos seguiam, a labuta aumentava. Na mudança das estações, Marculino encontrava outras lidas e as moedas ganhavam peso no interior de um velho fogão.
Se pensava em uma roupa melhor, achava bobagem. Seguia em frente, emendando buracos, costurando trapos.
Sapato, ora, deixava acabar até encostar a sola do pé na terra vermelha aí, emendava com borracha que achava na estrada. Tava mais que calejado! Não era problema, gostava de pisar no mato.
Sabonete era luxo. Fazia sabão com os coquinhos que colhia pelo terreiro.
Da criação não dava prova, não experimentava para não desperdiçar. Vendia galinha, vendia leitão, vendia ovo, depois, guardava a renda satisfeito. Comia farinha, raiz e verdura. Vez em quando, fazia um fubá com a banha que ganhava de um vizinho. Afinal, se o outro era bobo de dá, ele não era de recusá.
É... desse jeito vivia Marculino. E permaneceu na mesmice durante anos. Porém, ao completar certa idade, deu-se que não encontrou força de ir cortar a cana, de fazer catira, de renovar a produção. Já não havia nos pés maltratados condição de ir.
Cuidar da pequena horta parecia acolhedor, mas semente era cara, então, de repente, se gastava o que tinha, ficava sem nada. Recusou a solução, permaneceu sem ação.
Longe da lida, viu-se parte do que não sabia ser. Sem ter com quem falar, sem ter o que comer, sem ninguém que lhe desse ajuda... Porque enquanto era forte, Marculino não ajudou ninguém. Não fez graça, também não deu nada de graça. Teve moeda no fogão, ah, isso teve! Mas embora o dinheiro ganhasse tamanho e reluzisse sob seus olhos avaros, Marculino diminuiu. Escondeu-se da vida. Teve tanto medo de gastar a economia, que foi ele quem se gastou. Encolheu a tal ponto, que já não podia se mover.
E como nada que é triste vem sozinho, um dia o mundo pede a conta pra gente. A doença chegou, o velho já não deixava o colchão que era ainda mais velho. Aí, entendeu. Descobriu que o dinheiro ficaria no fogão. E ele?! Marculino seria raiz. Mas não daquelas que dão flores e enfeitam o horizonte. Não.
Na soma dos anos que percorreu, seria apenas um galho seco no chão. Tão sem cor quanto os trapos que juntou; tão silencioso quanto os momentos que não viveu; tão sem gosto quanto as miudezas preciosas que não provou.
Sem filho, sem esposa, certa tarde Marculino não resistiu devido à fraqueza e morreu. Foi um vizinho compadecido que viu seu destino e um lugar na terra lhe deu.
Algum tempo depois, o casebre ruiu. E foi o mesmo vizinho que, em meio ao pó e as cinzas, o dinheiro encontrou. Procurava a lata da banha, mas que artimanha! Graças ao interior do fogão, mudou de vida e, de pobre peão, era agora fazendeiro rico, temido na região.
A história de Marculino ganhou contorno no sertão. Toda noite, o povo de lá dizia, ao deixar a lida e sair do caminhão:
— Você esconde o ouro no fogão, mas não segura o tempo nas mãos... cuidado! Que a vida passa, a solidão devassa. E o que você junta e guarda, vem outro e traça.
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Olá :-D
ResponderExcluirPassei para espiar. Adorei o conto. Eu também escrevo, mas livros; sou péssima com histórias curtas, hehehehehehe. Vou continuar espiando seu blog.
Bj, Aris.
Olá querida!
ResponderExcluirSaudades de seu blog!!!!
Continuo com os meus, mesmo sem muito tempo para postar.
Estou fazendo mestrado e continuo trabalhando...Não é fácil pra mim, mas vou levando!
Detesto pessoas miseráveis de alma! Quero distancia de gente mesquinha e que tem medo de gastar o que tem. Pior ainda quando não quer casar só pra não ter que "dividir". Esse ser vai morrer infeliz e só...Cruzes!!!!
Beijão
Olá,Bruna!!!
ResponderExcluirPuxa!Que conto ótimo!!!! Infelizmente existem muitos Marculinos por aí...não necessáriamente da mesma forma,mas que dão mais importância para o ter do que para o SER.
E deixam de aprender, deixam de amar, de compartilhar...de viver!
Uma pena.A troco de amontoar dinheiro, riquezas, deixam de viver.
Adorei!!!Beijos pra ti!!!
Boa semana!
Adoro esse conto e não me canso de ler!
ResponderExcluirBjs.
Ana Paula